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sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Espécies invasoras ameaçam a biodiversidade do Estado

O sagui-do-nordeste (E), espécie exótica, e o mico-leão-dourado (D), nativo: cruzamento entre espécies diferentes ameaça biodiversidade

A extinção de espécies é uma ameaça real que afeta diversas regiões do Estado do Rio de Janeiro, sejam zonas urbanas, rurais ou florestais. A diversidade e a grande densidade de sua fauna e flora têm sido ameaçadas, de um modo geral, pelas atividades ditas antrópicas (humanas). O desmatamento, a ocupação de áreas de proteção ambiental motivada pela especulação imobiliária e a exploração econômica de matas e áreas florestais sem a necessária preocupação com o equilíbrio ambiental são as causas mais visíveis deste processo de extinção.

Mas a biodiversidade enfrenta outras sérias ameaças, que podem não se apresentar como tais para boa parte da população. A introdução de espécies exóticas, como micos, saguis e jaqueiras, e a disseminação em áreas de preservação ambiental de espécies domesticadas, como cães e gatos, são duas destas ameaças. Gatos, aliás, podem agir como predadores e competidores das espécies nativas da fauna. Num primeiro momento, restringem a quantidade destas e também a sua distribuição espacial e, em última instância, podem levá-las à extinção. Algumas espécies de micos e saguis, graças principalmente ao tráfico de animais silvestres, além de árvores frutíferas como a jaqueira, invadem ecossistemas e desestabilizam o equilíbrio existente. As populações invadidas não assimilam as espécies exóticas que são inseridas em seu habitat e, por isso, não têm meios para evitar a instalação do invasor.

A professora e pesquisadora do Laboratório de Ecologia de Mamíferos do Departamento de Ecologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Helena Bergallo, coordena uma equipe de pesquisadores que vem se dedicando, há mais de dez anos, ao mapeamento e à avaliação do impacto que as chamadas espécies exóticas vêm causando em vários ecossistemas do estado. Inicialmente, realizou, com o apoio da FAPERJ, um inventário das espécies locais ameaçadas de extinção. “Foi feita uma lista prévia, não oficial e que foi entregue à Secretaria de Estado do Ambiente (SEA). Mas pretendemos fazer uma lista oficial, mapeando onde estas espécies estão localizadas no estado, para que as pessoas comecem a controlá-las”, esclarece a pesquisadora.

Em 2009, Helena foi uma das organizadoras do livro Estratégias e ações para a conservação da biodiversidade no Estado do Rio de Janeiro, que apresenta uma proposta de manejo da biodiversidade para garantir a conservação dos recursos naturais em território fluminense para as futuras gerações e, especialmente, a sobrevivência de espécies nativas ameaçadas por espécies exóticas ou invasoras. “Vários países estão anos-luz à nossa frente em matéria de controle de espécies exóticas, e nós estamos apenas começando. E trabalhos de controle de espécies exóticas são poucos e muito pontuais. O foco de nosso projeto é o efeito das espécies exóticas nas espécies endêmicas ou nativas ameaçadas, espécies que estão estabelecidas na mesma área onde as espécies exóticas foram introduzidas. Creio que uma mudança de mentalidade em relação a este problema é o alvo maior da nossa pesquisa”, destaca a pesquisadora, que é Cientista do Nosso Estado, da FAPERJ. Ela coordena o projeto “Mamíferos endêmicos, ameaçados e exóticos do Estado do Rio de Janeiro”, cujo objetivo principal é propor medidas de controle e erradicação de espécies exóticas invasoras.

Micos e saguis
Sagui-da-serra-escuro: espécie endêmica encontrada no Parque Nacional da Serra dos Órgãos, no RJ
Em diversas áreas urbanas e florestais e também em regiões de proteção ambiental, é comum a presença de pequenos primatas, como micos e saguis. Eles ganham a simpatia e a proteção da população, que os consideram símbolos da preservação da fauna silvestre. Entretanto, muitas destas espécies são exóticas e ameaçam, na disputa por alimento e espaço, a sobrevivência de espécies nativas. Segundo Helena Bergallo, “é importante compreender que espécies exóticas podem ser oriundas de uma parte do território nacional e que não ocorriam na região onde foram introduzidas. Este é o caso do sagui-do-nordeste ou sagui-de-tufos-brancos (Callithrix jacchus) e do sagui-do-cerrado (Callithrix penicillata), por exemplo, que hoje em dia a gente vê por toda a cidade do Rio de Janeiro". Além disto, ressalta Helena, não se pode esquecer o tráfico de animais silvestres, que é uma maneira que a população tem de aumentar a renda. Apreendidas pelas autoridades ambientais, estas espécies são, com frequência, soltas na natureza, em vez de serem recolhidas a centros de triagem de animais silvestres.

O sagui-do-cerrado está ocorrendo como invasor, por exemplo, no Parque Nacional da Serra dos Órgãos, localizado na Região Serrana fluminense, onde há uma espécie endêmica ameaçada, que é o sagui-da-serra-escuro (Callithrix aurita), com densidade populacional baixa e distribuição restrita ao Rio de Janeiro e ao sul da Bahia, em áreas muito degradadas. Como são espécies do mesmo gênero, elas se hibridizam, ou seja, conseguem cruzar. De acordo com Helena, esta hibridização põe em risco a sobrevivência do sagui-da-serra-escuro: “Estas espécies congêneres acasalam e conseguem ter filhotes férteis. Não sabemos até que geração, mas sabemos que os filhotes são férteis. Como consequência, estamos perdendo geneticamente o Callithrix aurita. Portanto, é preciso controlar o Callithrix penicillata, erradicando-o da região”, pondera.

Segundo Helena, a possibilidade de devolver uma espécie exótica a seu habitat natural é praticamente impossível. Ela explica as razões: “Primeiro, porque não se sabe exatamente de onde ela veio. Segundo, porque você pode acabar transmitindo doenças que não estão presentes no habitat natural dele, adquiridas no habitat invadido. E aí o risco é muito maior. Este é um grave problema que a gente enfrenta, porque o correto seria realmente exterminá-las. Mas obviamente a população não compreende isto. ‘Poxa, você vai matar um gato?’ ‘Você vai matar um sagui?’ Não se consegue perceber que certas espécies de sagui, por exemplo, estão levando à extinção uma espécie que é nativa.”

Para a pesquisadora, o mesmo problema acontece com animais domésticos. “Temos conversado muito com o pessoal da Ilha Grande para diminuir a quantidade de cachorros e gatos na ilha. Os gatos têm um impacto muito grande sobre o meio ambiente local, e a quantidade gatos lá é muito alta. Temos orientado as pessoas que querem ter seus gatos e cachorros para, ao menos, esterilizá-los.”

Jaqueiras

Processo de anelamento para a erradicação da jaqueira
O caso da jaqueira é igualmente exemplar. Espécie originária da Índia e de outras regiões do sudeste asiático, foi introduzida no Brasil ainda na era colonial e se aclimatou muito bem em praticamente todo o território nacional. Tão bem que um pesquisador, por equivoco, chegou a batizá-la como Artocarpus brasiliensis (o nome correto é Artocarpus heterophyllus). A capacidade de dispersão da jaqueira é muito grande. Além do ser humano, diversos animais adoram seu fruto, contribuindo decisivamente para esta dispersão, enterrando a semente em vários lugares. “Um deles é o gambá, que é um importante dispersor de vários tipos de sementes. Quando ele chega em áreas com jaqueiras, perde este papel, porque passa a comer só jaca e deixa de comer as plantas nativas”, explica.

A equipe de pesquisadoras coordenada por Helena comparou áreas que tinham jaqueiras com áreas que não tinham, constatando uma grande mudança na comunidade de pequenos mamíferos. “Nas áreas sem jaqueiras, você tem uma comunidade composta por espécies frugíferas, insetívoras, onívoras, em geral pequenos mamíferos. E sem grande dominância de uma ou outra espécie”, esclarece. "Em áreas com jaqueiras, constata-se a grande dominância de uma ou duas espécies. Principalmente de uma espécie de rato, que se chama 'rato de espinho' (Proechimys sp.), que gosta muito da semente da jaca. Então, a população desta espécie de rato aumenta consideravelmente, perdendo-se outras espécies, como as insetívoras. Além disto, a folha da jaca é muito grossa, demora muito a decompor. Assim, os artrópodes ficam mais escassos em áreas com jaqueiras. E as espécies que comem insetos praticamente desaparecem", diz.

Para a pesquisadora, é possível controlar as jaqueiras invasoras. “Tenho um aluno que está tratando disto em sua dissertação de mestrado. Ele testou um tratamento físico e um tratamento químico para a erradicação de jaqueiras. O tratamento físico consiste em anelar [fazer incisões no caule em forma de anel] a jaqueira. Você tira uma camada, faz um anel e remove a camada externa, até o floema [tecido das plantas vasculares encarregado de levar a seiva elaborada pelo caule até a raiz e aos órgãos de reserva]. Isto é feito para que se interrompa a conexão da parte de cima com a parte de baixo da árvore”.

Já no tratamento químico, um herbicida é utilizado. “São feitos vários furos na árvore e se injeta um herbicida em quantidades baixas e controladas. Esse é o método que produz melhor resultado”, pondera Helena. No entanto, a dosagem adequada para aplicação do herbicida ainda não foi encontrada pela equipe. “Este é o próximo passo. A dosagem inicial foi muito baixa, por conta do receio de contaminação do meio ambiente próximo. Mesmo assim, houve alguma mortalidade das árvores”, reconhece.

O caso da Serra da Tiririca

Um caso muito ilustrativo deste problema é o que ocorreu há alguns anos na Serra da Tiririca, em Niterói, onde houve uma grande dispersão de uma espécie exótica. Um grupo de Leontopithecus chrysomelas, o chamado mico-leão-de-cara-dourada, foi apreendido e entregue a um veterinário local, com o objetivo de preservá-los e para que não fossem dispersados pela região. OLeontopithecus chrysomelas é também uma espécie ameaçada de extinção mesmo em seu local de origma. A intenção do veterinário era a de reproduzir a espécie em cativeiro.

Porém, com a morte inesperada do veterinário, pouco depois os micos foram soltos e voltaram à mata na região. Rapidamente, eles se disseminaram por toda parte e podem, a qualquer momento, atingir o habitat do micro-leão-dourado (Leontopithecus rosália). Como são do mesmo gênero, é possível que ocorra uma hibridização, havendo o risco de se perder geneticamente omicro-leão-dourado. Agora, uma mobilização de diversos órgãos e instituições de pesquisa está permitindo que sejam retirados do local e realocados para o seu habitat natural, no sul da Bahia.

Emerging Infectious Diseases - Volume 17, Number 2–February 2011

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Table of Contents 
Volume 17, Number 2–February 2011 

  PERSPECTIVE
     B.B. Chomel and B. Sun 

SYNOPSIS
     N. Kamar et al. 


RESEARCH
     U. Kappeli et al. 

     M. Altmann et al. 

     L. MacDougall et al. 

     E.J.A. Schrauwen et al. 

     C. Cao et al. 

     J.A.P. Earle et al. 

     A.R. Katz et al. 

     D.M. Engelthaler et al. 

     A.D. LaBeaud et al. 


DISPATCHES
     G. Peirano et al. 

     C. Jackson et al. 

     M.-O. Vareil et al. 

     D. Tappe et al. 

     S.B. Graitcer et al. 

     S. Shakoor et al. 

     P. Mann et al. 

     Y. Li et al. 

     J.R. Harris et al. 

     M. Quesnel-Vallieres et al. 

     N. Silva et al. 

     M. Hasegawa et al. 

     J.E. Ramirez-Gonzalez et al. 

     C.K. Lee et al. 

     G. Khan et al. 

     C.E. Faux et al. 

     J.-Y. Yeh et al. 


ANOTHER DIMENSION
     V. Liayanapathirana 


LETTERS
     O. Oncul et al. 

     S.A. Norman et al. 

     N. Tijet et al. 

     A. Papa and I. Christova 

     E. D'ortensio et al. 

     R.H. Evans 

     F. Jori et al. 

     J. Luczkowiak et al. 

     A. Cady et al. 

     P. Spigaglia et al. 

     P.V. Fulmali et al. 

     J. Sun et al. 

     A.E. Jaaskeläinen et al. 

     L. Rumer et al. 


BOOK REVIEWS
     K. Gensheimer 

     D. Raoult 


ABOUT THE COVER
     P. Potter 


NEWS AND NOTES

  
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Centers for Disease Control and Prevention 

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Controverso, teste genético pelo correio chega ao Brasil

Muito comum nos Estados Unidos, o teste que vasculha o DNA em busca de doenças genéticas acaba de chegar ao Brasil. Por R$ 4.990, um laboratório de Minas Gerais promete identificar os riscos de desenvolver 46 moléstias. De Alzheimer à obesidade.

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O exame é controverso e condenado por alguns especialistas. Eles dizem que, atualmente, pouco adianta saber se um indivíduo tem 3% ou 4% a mais de chances de desenvolver uma doença.

O diretor da clínica, Sérgio Pena, médico-geneticista da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e um dos pioneiros do exame de paternidade por DNA do Brasil, defende a análise.

Para ele, quando uma pessoa identifica que tem um risco maior de ter uma doença, como diabetes, pode mudar seu estilo de vida e, assim, minimizar as chances de efetivamente desenvolvê-la.

"Em casos como os de câncer de mama, por exemplo, seria possível intensificar as consultas com o médico e fazer exames com mais regularidade", disse à Folha.

O kit de coleta é enviado para a casa do paciente, que recolhe células da boca e as envia para o laboratório.

Ao invés de mapear todo o genoma, o teste busca variações específicas no DNA, os SNP's (pronuncia-se "snip"). A partir delas, calcula-se o "perigo".

"Todo o processo tem o acompanhamento de um médico", diz Pena.
Ao final do processo, o paciente tem direito a uma consulta com um geneticista. Se não puder comparecer, ela pode ser feita por e-mail.

Uma pesquisa com 2.037 pessoas que se submeteram a esse tipo de teste, publicada no "New England Journal of Medicine", indica que não houve mudanças significativas nos hábitos alimentares ou na prática de exercícios desses indivíduos. Ou seja, não adiantou muita coisa.

O estudo também apontou que alguns laboratórios deram até diagnósticos conflitantes para as mesmas amostras de DNA.

"Sou contra esse tipo de teste para quem não tem casos de doenças genéticas graves na família" afirma Mayana Zatz, geneticista que comanda o maior laboratório de genética da América Latina, o Centro de Estudos do Genoma Humano da USP. "Com certeza, é um prato cheio para os hipocondríacos", avalia a cientista.

Cientistas 'fabricam' vasos sanguíneos em laboratório

Veias estão disponíveis imediatamente para cirurgia e têm menor incidência de infecção, obstrução e coagulação


SÃO PAULO - Pesquisadores norte-americanos conseguiram "fabricar" veias em laboratório que estão disponíveis imediatamente para cirurgia e têm menor incidência de infecção, obstrução e coagulação. A pesquisa, descrita na edição desta quinta-feira, 3, da revista Science Translational Medicine, promete avanços para cirurgias como a Ponte de Safena e para o acesso vascular na hemodiálise.
Science/Divulgação
Science/Divulgação
Um dos vasos sanguíneos criados em laboratório
Segundo os pesquisadores, a habilidade de gerar diversos vasos sanguíneos de uma só vez também vai diminuir os custos, além de aumentar a rapidez com que eles chegam aos pacientes, pois um número relativamente alto de veias será produzido em um banco de células.
A cirurgia de ponte de safena tem como procedimento padrão retirar uma veia do próprio paciente, normalmente da perna, para ser usada como uma "ponte" de desvio do sangue da aorta para as artérias coronárias.
Como essa técnica de bioengenharia serve tanto para vasos de pequeno quanto de grande diâmetro, ele oferece esperança de sobrevida para os pacientes que precisam passar por essa cirurgia, mas não têm veias ou artérias adequadas e também não são candidatos às veias sintéticas devido ao tamanho necessário para o enxerte.
Além disso, retirar uma veia da perna do paciente pode levar a complicações futuras, afirmam os pesquisadores. Portanto aperfeiçoar a técnica pode eliminar a necessidade de utilizar o vaso sanguíneo do próprio paciente - procedimento padrão atual.
No caso da hemodiálise, mais da metade dos pacientes não têm as veias saudáveis necessárias para passar pelo tratamento intravenoso e precisam usar cateteres. A possibilidade de substituição das veias de acesso comprometidas diminuiriam a propensão a complicações como infecções e tromboses.
Essa semana pesquisadores da Universidade de Pittsburgh também anunciaram avanços no cultivo de artérias mais elásticas em laboratório. Os testes, realizados com veias de babuínos, conseguiram artérias mais ricas em proteínas responsáveis pela elasticidade dos tecidos. A pesquisa foi descrita na Proceedings of the National Academy of Sciences.

Brasileiros desvendam mecanismos de doenças nos rins

Brasileiros desvendam mecanismos de doenças nos rins
A diminuição da disfunção renal se deve à reversão da lesão associada à desorganização dos podócitos - células que são centrais para o processo de "filtragem" da urina, realizado nos glomérulos, as unidades funcionais dos rins.

Inflamações nos rins
Cientistas brasileiros estão obtendo diversos avanços na compreensão dos processos inflamatórios relacionados às lesões renais.
O grupo, coordenado por Niels Olsen Câmara, da Universidade de São Paulo (USP), acaba de desvendar a estreita conexão entre a resposta inflamatória do sistema imunológico e a glomeruloesclerose segmentar e focal (GESF), uma doença que pode levar à insuficiência renal aguda e ao decréscimo na função renal.
O trabalho, que será publicado em breve na revista Kidney International, mostra que a expressão de um receptor do hormônio bradicinina (receptor B1) é induzida durante o curso da doença.
Diminuindo a expressão do receptor B1, por outro lado, verificou-se uma melhora da disfunção renal.
Disfunção renal
De acordo com Câmara, a diminuição da disfunção renal se deve à reversão da lesão associada à desorganização dos podócitos - células que são centrais para o processo de "filtragem" da urina, realizado nos glomérulos, as unidades funcionais dos rins.
"O trabalho demonstrou, pela primeira vez, que o bloqueio dessa via é capaz de provocar uma melhora na disfunção dos podócitos. A descoberta abre perspectivas para estudos futuros que possam usar esses dados como ferramenta terapêutica.
A GESF é uma das principais doenças do glomérulo em crianças e adultos e pode voltar a ocorrer depois de um transplante de rim", disse o pesquisador.
Os dados foram gerados a partir dos trabalhos de iniciação científica de Bruna Buscariollo e de doutorado de Rafael Pereira.
Os cientistas utilizaram um modelo de indução de GESF por adriamicina - um fármaco de alta toxicidade usado clinicamente contra o câncer - a fim de estudar o papel do receptor B1 na evolução da doença.
Por outro lado, a administração de um antagonista do receptor B1 permitiu demonstrar que, com a diminuição de sua expressão, a doença pode, em tese, ser revertida.
"Considerando a complexidade das lesões renais agudas e crônicas, qualquer estratégia de tratamento efetivo para essas condições deverá ser capaz de modular o processo inflamatório na tentativa de reparar o tecido. Isso significa que o tratamento deve ser capaz de reverter as lesões agudas e suas consequências a longo prazo, restaurando a arquitetura do órgão e sua homeostasia - isto é, a propriedade de regular seu ambiente interno para manter uma condição estável, por meio de múltiplos ajustes controlados por mecanismos de regulação", explicou Câmara.
Insuficiência renal aguda
A insuficiência renal aguda - cuja mortalidade tem-se mantido acima dos 50% nos últimos 20 anos - provoca a longo prazo a perda da função do órgão. Além da GESF, a insuficiência pode ser causada pela toxicidade de drogas e, principalmente, por lesões de isquemia e reperfusão.
"Uma lesão em qualquer parte do corpo - como o esmagamento de uma perna, por exemplo, causa uma diminuição brusca na oferta de oxigênio para os rins, ocasionando lesões as lesões denominadas isquemia. Mais tarde, o restabelecimento dos níveis de oxigênio leva a uma segunda onda de injúria no ri, as chamadas lesões por reperfusão. Trata-se de um problema grave e muito comum. Quando o paciente necessita de diálise, a mortalidade pode chegar a 80%", disse.
As lesões renais agudas, segundo Câmara, são inevitavelmente associadas a um processo inflamatório, causando disfunção dos podócitos - no caso das glomerulopatias como a GESF - ou na chamada região túbulo-intersticial, no caso das lesões por isquemia e reperfusão.
"A persistência dessa resposta inflamatória pode levar à perda da arquitetura dos tecidos, com depósito de colágenos e o decréscimo na função renal - um processo até agora considerado irreversível. O estudo do processo inflamatório nas lesões renais agudas que acometem a região túbulo-intersticial é bem documentado na literatura. Mas a participação da resposta imune em doenças glomerulares havia sido pouco explorada até agora", afirmou.
Isquemia e fibrose renal
O papel dos receptores da bradicinina, segundo Câmara, já vinha sendo estudado há alguns anos por seu grupo de pesquisa em colaboração com o grupo dos professores João Bosco Pesqueiro e Ronaldo Araújo, ambos do Departamento de Bioquímica da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
"Em outro modelo de estudo, no qual os animais são submetidos a uma isquemia renal e depois à reperfusão, ficou evidente a participação desse sistema na injúria renal", disse o professor do ICB-USP.
Resultados gerados pela pesquisa de doutorado de Pamella Wang demonstraram, segundo Câmara, que o receptor B1 tinha papel central na resposta inflamatória desencadeada pela isquemia. Os dados foram publicados na revista PLoS One, em 2008.
"Tantos os animais geneticamente deficientes para o receptor B1 como os tratados com antagonistas farmacológicos, após injúria renal apresentaram uma menor disfunção dos rins associada a uma expressão aumentada de certas citocinas antiinflamatórias, substâncias que mediam diversos processos no organismo", disse.
Outro trabalho abordou o contexto do desenvolvimento de fibrose renal após uma lesão nos rins. Os animais geneticamente deficientes para o receptor B1 apresentaram menor depósito de colágeno após a obstrução do fluxo urinário. Os resultados do estudo foram publicados na revista International Immunopharmacology, em 2006.
"Todos esses dados obtidos em modelos experimentais indicam que as afecções renais agudas e crônicas têm uma participação ativa do sistema de cascatas enzimáticas que envolvem a bradicinina. Estamos vendo que a participação desse sistema vai além dos papéis conhecidos do hormônio bradicinina, envolvendo uma regulação da função dos podócitos e o controle do processo inflamatório", disse Câmara.
Proteínas e moléculas
Além de revelar a relação entre o receptor B1 e a GESF, o trabalho que será agora publicado na Kidney International também demonstra que o bloqueio do receptor B1 se traduziu no aumento da expressão da hemeoxigenase-1 (HO-1), proteína que tem diversas funções fisiológicas no organismo.
De acordo com Câmara, a vertente central do Projeto Temático que coordena consiste em investigar o papel da HO-1 em diferentes processos inflamatórios renais em modelos animais.
Os estudos sobre bradicinina e lesão renal fazem parte dessa linha de pesquisa mais ampla.
"Nosso laboratório vem estudando vários mediadores presentes no processo inflamatório nas afecções renais e a resposta dos tecidos a essas agressões. Uma importante faceta nesses estudos é a percepção de que, frente a uma agressão, o órgão desenvolve uma resposta protetora ao aumentar a expressão de uma série de moléculas com capacidade intrínseca de proteção celular. A HO-1 é uma dessas moléculas", explicou.
A HO-1 está presente em plantas e animais, o que sugere uma grande importância da molécula em termos evolutivos. Quando há uma lesão em um tecido, a expressão HO-1 é aumentada, o que faz dela um sensor de estresse celular - isto é, uma espécie de marcador de lesões teciduais.
"Por outro lado, quando há lesão, o aumento da expressão dessa molécula ocorre porque ela é capaz de modular o processo inflamatório. Por isso, houve interesse em investigar se essa modulação poderia alterar a evolução de uma patologia", disse Câmara.
Ao verificar que a proteção originada com o bloqueio do receptor B1, em diferentes modelos que usamos, foi associada a uma alta expressão da HO-1, os estudos realizados pelo grupo do ICB-USP sugerem que vias metabólicas conservadas evolutivamente são conectadas a diferentes cascatas do processo inflamatório.
"Seria possível, então, pensar em meios e métodos de potencialização dos mecanismos naturais de defesa do organismo como uma terapia clínica auxiliar", sugeriu.
Proteção celular
Vários trabalhos na literatura internacional, incluindo os estudos do grupo coordenado por Câmara, mostraram efeitos de proteção celular da HO-1 em modelos experimentais de doenças renais agudas. "No entanto, até agora não existiam dados comprovando a capacidade da HO-1 em reverter um processo cicatricial renal já instalado", afirmou.
Dados obtidos na pesquisa de doutorado de Matheus Corrêa Costa - que também está sendo realizado no ICB-USP com Bolsa da FAPESP - mostram que o tratamento com um potente indutor de HO-1 diminuiu significativamente os marcadores de inflamação assim como a expressão de moléculas relacionadas ao desenvolvimento de fibrose renal nos animais submetidos a uma obstrução irreversível do fluxo urinário. O trabalho foi aceito para publicação, em 2010, na revista PLoS One.
"Sete dias depois da obstrução, o tratamento tardio com esse indutor de HO-1, conhecido como hemin, foi capaz também de diminuir a expressão de moléculas que favoreciam a fibrose e a inflamação, além de reduzir a deposição de colágeno. O estudo mostrou, pela primeira vez, que a HO-1 pode reverter o processo de cicatrização renal já instalado, provavelmente induzindo a diferenciação de miofibroblastos", disse.