Não-cerebral e não-neuronal
A doença de Huntington, considerada por muito tempo como um problema puramente neurológico, não tem origem exclusivamente no cérebro.
Conforme apontam diversos estudos recentes, ela pode surgir primeiro em órgãos e tecidos periféricos e até mesmo em células não-neuronais.
Uma nova pesquisa realizada por cientistas da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) reforçou a tese da origem não-cerebral e não-neuronal da doença.
Os pesquisadores brasileiros demonstraram que a proteína causadora da doença de Huntington pode estar presente no coração.
O estudo foi apresentado em setembro no Congresso Mundial da Doença de Huntington, realizado na Austrália, e foi publicado em um suplemento especial da revista Clinical Genetics, dedicado exclusivamente ao evento.
Biomarcadores precoces
A pesquisa demonstrou que a huntingtina, a proteína que está associada à doença, podia estar presente em células não nervosas no coração e, portanto, não é específica de neurônios.
De acordo com os pesquisadores, a nova perspectiva de uma origem não-cerebral e não-neuronal da doença sugere uma nova linha de investigação científica voltada para a busca de biomarcadores precoces da doença, a fim de antecipar o diagnóstico, propor estratégias mais eficazes de tratamento e aumentar a sobrevida dos pacientes.
Segundo Antônio Augusto Coppi, um dos autores do estudo, a doença de Huntington não pode mais ser tratada apenas como uma desordem puramente neurológica, uma vez que tem efeito e até origem em vários órgãos e tecidos periféricos, como coração - conforme demonstrado no estudo -, fibras musculares estriadas esqueléticas, ossos, testículos, pâncreas, sistema imune e sistema nervoso entérico e cardíaco.
"Existe um dogma entre os neurologistas que considera o cérebro como único local de origem desse tipo de doença. Mas sabemos que 30% dos pacientes com a doença de Huntington morrem de problemas cardíacos e não neurológicos. Por isso temos realizado estudos para entender a cronologia de surgimento e evolução da doença e como ela afeta o coração", disse.
Problemas no coração
"A doença causou nos animais estudados uma hipertrofia do coração e uma disfunção da inervação simpática do órgão. Acreditamos que a hipertrofia ocorra justamente para compensar a falha da inervação. Tudo isso pode levar a problemas cardíacos, explicando a grande porcentagem de pacientes com a doença que morrem de problemas cardíacos e não neurológicos", disse o pesquisador.
Além de quebrar o dogma da origem exclusivamente cerebral, segundo Coppi, os novos estudos têm mostrado que a doença surge não só em neurônios, mas também em células não-neuronais.
"Existem neurônios em inúmeros órgãos fora do cérebro, como coração, intestino, pâncreas, traqueia, bexiga e fígado. Mas muitas vezes a doença surge em células que não são nervosas, mas fibras musculares do miocárdio, células do testículo e da medula óssea. Isso faz com que os pacientes desenvolvam doenças do coração, atrofia dos testículos e osteoporose, por exemplo", explicou.
Ao buscar novos marcadores biológicos que possam antecipar o diagnóstico das doenças, os pesquisadores abrem caminho para novos tratamentos que possam retardar o aparecimento dos primeiros sintomas, ou prolongar a vida do paciente. Ainda não há perspectivas de cura para a doença de Huntington.
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