Sistema público de saúde não incentiva o parto normal
Emoções da mulher
A Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda o parto normal, em detrimento das cesarianas, bem como que os procedimentos sejam humanizados e ofereçam uma assistência segura com o uso apropriado das tecnologias para as gestantes e bebês.
Mas a maioria dos hospitais da rede pública de saúde do Estado de São Paulo ainda não segue esse modelo.
"O profissional da saúde geralmente não tem o preparo para lidar com as emoções da mulher. Sua vontade e seu bem-estar não são priorizados na hora do parto," resume Cláudia de Azevedo Aguiar, da USP.
A pesquisadora analisou prontuários de parturientes de dois hospitais da rede pública de São Paulo, sendo que um deles utiliza o modelo humanizado e o outro o modelo tradicional, com centro obstétrico.
Parto humanizado
O parto humanizado prevê assistência total à mulher durante o trabalho de parto, visando o conforto e bem-estar da mãe e do bebê.
Dentre as ações envolvendo o parto humanizado, registradas desde 1996 nas Recomendações da OMS, estão:
- Elaboração de um plano pessoal que determine onde e por quem será assistido o nascimento.
- Direito ao leito hospitalar no ato do parto.
- Disponibilidade de líquidos orais durante o trabalho de parto (no modelo tradicional, ainda se adota o jejum, o que já foi esclarecido pela Medicina Baseada em Evidências como prejudicial para a saúde da mulher e do bebê).
- Não utilização de métodos invasivos e farmacológicos para alívio de dor durante o trabalho de parto, substituídos por alternativas como massagens e técnicas de relaxamento.
Decisão médica arbitrária
As mulheres analisadas eram consideradas saudáveis, o que as colocava na condição ideal para a realização do parto normal.
Entretanto, por motivos diversos - esclarecidos de forma bastante contraditória nesses prontuários - elas foram submetidas à cesariana.
"Algumas intercorrências podem levar a uma mudança de planos na realização do parto. O que ficou claro no estudo é que muitas mulheres poderiam ter seus bebês pelo parto normal, mas em função de intervenções excessivas ou por uma decisão médica arbitrária, elas foram impedidas," afirma Cláudia.
Mesmo o direito ao acompanhante, garantido pela lei nº 11.108 de 2005, não é respeitado.
"Os serviços de saúde do Sistema Público de Saúde, da rede própria ou conveniada, ficam obrigados a permitir a presença, junto à parturiente, de 1 (um) acompanhante durante todo o período de trabalho de parto, parto e pós-parto imediato," diz a lei.
Contudo, uma das justificativas que Cláudia teve da dirigente do hospital tradicional foi de que, por serem salas coletivas, os acompanhantes inibem as outras gestantes e lhes causam desconforto.
Humanização falha
Mesmo no hospital que utiliza técnicas do parto humanizado, pode se constatar falhas.
Segundo Cláudia, apesar de alguns direitos serem respeitados, como acompanhante, outros pontos são deixados de lado. "As gestantes ainda são submetidas a substâncias químicas e farmacológicas para acelerar as contrações e isso pode ser extremamente danoso para mulher e para o bebê".
Uma substância muito utilizada é a ocitocina. Ela aumenta as contrações intrauterinas, o que acelera a dilatação da mulher, mas em contrapartida causa muitas dores na gestante. Ela é altamente danosa para o corpo humano, quando utilizada incorretamente e só é recomendada em casos extremos, quando as contrações estão abaixo do normal ou quando há parada na progressão do trabalho de parto.
Cláudia destaca que o parto normal garante uma recuperação muito mais rápida à mulher, a mãe pode ficar com o bebê o tempo todo - o que não acontece na cesariana - há menos perda de sangue e menos uso de medicamentos e taxa de mortalidade menor.
"Infelizmente, a cultura popular cultiva uma visão errada do parto normal, como algo muito doloroso. Claro que existe dor, mas todas as mulheres são capazes de passar pelo parto normal", afirma.
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