Criação de proteínas
As proteínas são as moléculas mais abundantes e importantes de qualquer organismo, participando numa variedade imensa de tarefas e sendo essenciais para a vida.
Esta capacidade de intervir em quase todos os processos biológicos significa que, no dia em que aprendermos a sintetizá-las em laboratório, teremos em mãos um instrumento de extraordinário potencial.
Infelizmente, isto não tem-se mostrado ser muito fácil.
Mas agora tudo pode mudar com um estudo publicado na revista Science por pesquisadores portugueses do Instituto Gulbenkian de Ciência.
A equipe desenvolveu uma nova técnica para criar proteínas e demonstrou sua eficiência sintetizando uma nova proteína especificamente projetada para ajudar a desenvolver uma vacina mais eficaz contra o vírus da imunodeficiência humana (HIV).
"O protocolo poderá agora ser usado no design de qualquer proteína, incluindo medicamentos, novos biocombustíveis e até proteínas com funções nunca antes observadas na natureza," disse Bruno Correia, coordenador da equipe.
Proteínas artificiais
Aprender a criar proteínas em laboratório tem sido, nas últimas décadas, uma espécie de "santo graal" da biologia molecular, mais especificamente de uma área emergente chamada biologia sintética.
A função de uma proteína é determinada pela sua estrutura tridimensional (3D), e esta pela sequência dos seus aminoácidos (os "tijolos" que a constituem) que, ao interagir entre si, como resultado das suas diferentes características físico-químicas, formam a tal estrutura tridimensional.
Mas entender como se forma uma estrutura 3D que é biologicamente ativa a partir de uma sequência linear de aminoácidos tem sido extremamente problemático, já que as interações entre estes são complexas e difíceis de prever.
A abordagem desenvolvida por Correia e seus colegas para resolver isto inova ao combinar o melhor de dois métodos já existentes.
O primeiro é o chamado método evolutivo, quando onde proteínas com funções semelhantes àquela que queremos criar são mutadas com o objetivo de levar à "evolução" da proteína com a função desejada.
O segundo é o design computacional, no qual programas de computador tentam prever a combinação de diferentes aminoácidos que leva à estrutura 3D com a função pretendida.
Proteína contra o HIV
Como o pesquisador explica: "individualmente cada um destes métodos tem limitações que têm sido impossíveis de ultrapassar. Mas a estratégia agora publicada funciona porque tira o melhor de ambos, usando a capacidade dos programas computacionais para explorar um espaço enorme de sequências e a eficácia da evolução de proteínas para selecionar aquelas que desempenham a função pretendida".
No caso da molécula agora desenhada - cuja função é servir como base para uma nova e mais eficaz vacina contra o HIV - a ideia era ter uma proteína para onde seriam transplantados "pedaços" essenciais do HIV (essenciais no sentido de que nunca são mutados/alterados) para que a proteína resultante pudesse ser usada para produzir anticorpos altamente eficazes contra o HIV.
Assim, a nova abordagem começa usando os métodos computacionais para procurar a melhor proteína para receber/hospedar estes "pedaços" essenciais do HIV (uma que não perturbe a estrutura 3D destes).
A seguir, uma vez feito o transplante, a molécula criada é submetida a uma série de mutações.
As novas versões (mutadas) são então analisadas por computador para escolher aquela com a estrutura 3D mais semelhante ao que é visto no vírus real.
"E embora estejamos ainda numa fase muito embrionária do processo, a ideia é que a proteína agora obtida vai servir para desenvolver uma vacina mais eficaz contra o vírus" - conclui Correia.
Vacinas antivirais
O grande problema das vacinas antivirais - e a razão por que há tão poucas e porque todos os anos se lança uma nova vacina contra a gripe - é que estas tendem a perder a eficiência rapidamente devido à alta taxa de mutação/transformação dos vírus.
Ao tentar assegurar que os anticorpos formados são contra-partes essenciais do vírus, a ideia é ter uma vacina mais eficaz e de longa duração.
"E agora que o novo protocolo mostrou sua eficácia," diz Correia, "as possibilidades são enormes. Afinal do diabetes à hemofilia, a doença da vaca louca, câncer ou mesmo Alzheimer, o problema é um só - proteínas defeituosas ou ausentes."
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