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sexta-feira, 10 de junho de 2011

Exames de diagnóstico de câncer de mama podem ganhar mais precisão

Vinicius Zepeda
     Divulgação
             
        Precisão dos resultados positivos de
        mamografia saltou de 80.2% para 96,5%

 

Um algoritmo matemático de processamento de imagens desenvolvido por dois engenheiros do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), os irmãos Márcio e Marcelo Portes de Albuquerque, promete dar novo impulso ao diagnóstico do câncer de mama. A nova abordagem, descrita em artigo publicado pelos pesquisadores no ano de 2004, foi testada no final do ano passado por três pesquisadores do Instituto Indiano de Tecnologia Kanpur e os resultados foram animadores, se comparados às técnicas normalmente usadas. Os índices de acerto nos resultados positivos subiram consideravelmente. Já os falsos positivos – exames em que o resultado aparece equivocadamente como positivo – caíram vertiginosamente. "O índice de confiabilidade dos resultados positivos saltou dos atuais 80,2% para um índice muito próximo da certeza absoluta: 96,5%", afirmam Márcio e Marcelo. "Já os falsos positivos caíram de 8,1% para quase zero absoluto: apenas 0,4%", complementam.

O procedimento, que filtra as informações relevantes que aparecem como pontos brancos nos exames de mamografia – radiografias usadas para diagnosticar a doença – ajuda a identificar as chamadas microcalcificações – minúsculas pedras resultantes do acúmulo de cálcio. "Em 20% dos casos, contornos irregulares nas microcalcificações podem ser causados pelos tumores", afirmam os engenheiros. Descrita pelos dois pesquisadores, a técnica consiste em utilizar, para o processamento de imagens de raios-X, a chamada entropia não-aditiva, teoria formulada por outro pesquisador do CBPF: o físico Constantino Tsallis, que é Cientista do Nosso Estado da FAPERJ e coordenador do Instituo Nacional de Ciência e Tecnologia de Sistemas Complexos (INCCT-SC), cofinanciado pelo CNPq e pela FAPERJ.

A teoria, também chamada de Estatística de Tsallis, serve para entender o comportamento de sistemas complexos como o corpo humano, a economia e a linguística, entre outros. O físico explica didaticamente como funciona sua teoria, exemplificando com a massa de ar presente numa sala. "Para se movimentarem, as moléculas de ar presentes podem assumir milhares de comportamentos, como ir para a frente, para trás, esquerda, direita, para cima, para baixo, e assim por diante", ensina Tsallis. Segundo o pesquisador, estas moléculas são chamadas de sistemas simples, e o direito de usar todas as possibilidades de movimento será sempre exercido. Já nos sistemas complexos, como o cérebro humano e seus milhares de neurônios, ou mesmo a Bolsa de Valores, a distribuição de renda da população e a linguística, o número de possibilidades é restrito e, portanto, bem menor. "Eles são muito seletivos e sempre restringem seu comportamento. Eu procuro identificar estas possibilidades, o que nem sempre é fácil", complementa.

"Precisamos realizar um amplo debate sobre inovação", defende Marcelo

Constantino Tsallis mostra-se bastante empolgado com a utilização de sua teoria para processamento de imagens e, mais especificamente, para a melhoria do diagnóstico do câncer de mama. Ele explica a importância da nova técnica. "Quando há suspeita de câncer de mama, o primeiro exame que o ginecologista pede é este dos pontos brancos. Ele olha e, se achar necessário, pede o exame específico das microcalcificações", explica Tsallis. "Porém, como já vimos, com a técnica desenvolvida pelos engenheiros Márcio e Marcelo, o índice de confiabilidade dos exames aumentou consideravelmente, saindo de 80,2% de certeza – no caso dos resultados positivos – para 96,5%", acrescenta.
Divulgação/CBPF 
      
Constantino Tsallis: nome citado
em mais de 10.000 artigos científicos


Os engenheiros Márcio e Marcelo querem agora repetir a experiência realizada pelos indianos junto a médicos brasileiros. Para isso, eles esperam conseguir o apoio de uma empresa nacional ou multinacional interessada em se associar nessa empreitada. Os pesquisadores da Índia utilizaram algoritmos tendo como bases imagens específicas para a caracterização das técnicas. "Precisaríamos, através de uma associação com empresas do setor de saúde, investir na caracterização do algoritmo para uma grande base de imagens. Esta tecnologia poderia ser efetivamente transferida para que as empresas pudessem explorá-la comercialmente em equipamentos já existentes", explica Márcio. "Estamos tentando utilizar os atuais incentivos à Inovação Tecnológica para entrarmos em contato com empresas interessadas em inovar e ajudar-nos nesta empreitada", complementa.

O fato ilustra bem a necessidade dos governos federal, estadual, municipal e as sociedades se mobilizarem para fortalecer cada vez mais o ambiente de inovação no País. "Tanto as universidades precisam se aproximar das empresas e vice-versa, através da contratação de pesquisadores ou do incentivo real às atividades de pesquisa e desenvolvimento", explica Marcelo. "Atualmente, todas as esferas de governo vêm incentivando a criação de áreas para pesquisa e desenvolvimento nas empresas a fim de fortalecer a parceria com as instituições de pesquisas brasileiras", conclui.

Um físico de renome internacional

Nascido na Grécia em 1943, Constantino Tsallis tinha quatro anos quando, levado pela família, emigrou para o Brasil. Após breve estada por aqui, a família se transferiu para Mendoza, na Argentina, onde completou os estudos primários e secundários. Diplomado pelo Instituto de Física de Bariloche, em 1965, seguiu para a Europa no ano seguinte, após obter uma bolsa de estudos do governo francês. Ao longo de quase uma década de permanência em território francês, lecionou Física regularmente na Universidade de Paris e na École de Physique et Chimie de Paris. Em 1974, recebeu o diploma de Docteur d'Etat en Sciences Physiques pela Universidade de Paris-Orsay por pesquisas na área de Teoria de Transições de Fase. Em 1975, emigrou de volta ao Brasil – país ao qual solicitou e obteve a nacionalidade brasileira em 1984. Em 1988, formulou sua mais célebre teoria, a entropia não-aditiva, em que tenta explicar o comportamento dos sistemas complexos, que leva seu nome.

Em razão de sua produção científica, já foi citado nominalmente (seu nome no título ou no resumo da publicação) em mais de mil quatrocentos artigos de outros pesquisadores, em mais de 60 países – feito que no Brasil o aproxima, nesse indicador, ao do célebre médico sanitarista Carlos Chagas, descobridor da doença que porta seu nome. Os números que refletem sua atuação são superlativos. Publicou mais de 300 trabalhos que receberam mais de dez mil citações na literatura especializada internacional, e proferiu mais de 800 conferências em eventos e instituições de cerca de 40 países.

Em maio deste ano, Constantino Tsallis recebeu um convite da Academia de Ciências do Vaticano para fazer uma palestra em outubro. É a primeira vez na história que um físico brasileiro é convidado para se apresentar na instituição. Tsallis ministrará a conferência "Da física estatística à mecânica quântica não-linear". Além dele, o evento ainda terá a presença dos físicos Carlo Rubia e Gerardus Hooft, ambos ganhadores do Prêmio Nobel de Física.

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