Pesquisadores desenvolveram um novo método para estudar uma rara doença genética que pode servir de modelo e facilitar a pesquisa de outros problemas que atingem células-tronco. |
Doença genética
Um grupo de pesquisadores da Escola de Medicina da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, integrado por um brasileiro, desenvolveu um método para estudar em laboratório uma rara doença genética.
Essa doença pode servir de modelo e facilitar a pesquisa de outras doenças causadas pelo mau funcionamento do sistema celular.
O estudo foi descrito em um artigo publicado na revista Nature, cujo primeiro autor é o brasileiro Luís Francisco Zirnberger Batista.
Doenças que atingem as células-tronco
Por meio da pesquisa, os pesquisadores desenvolveram células pluripotentes induzidas (iPS, na sigla em inglês) de pacientes com disqueratose congênita.
Essa é uma doença rara, causada pelo rápido encurtamento de longas sequências repetitivas de DNA que ficam na extremidade dos cromossomos (os telômeros) - para estudar suas células-tronco.
Ao analisar essas células iPS, que são morfologicamente idênticas às células-tronco humanas, os pesquisadores conseguiram demonstrar, pela primeira vez, como funciona o mecanismo da doença, que varia de paciente para paciente dependendo das mutações em determinados genes de suas células.
Além disso, também observaram que as células-tronco dos pacientes com disqueratose congênita possuem uma capacidade de se renovar extremamente reduzida. O que explica as diferenças da severidade da doença, que abrange desde problemas de pigmentação da pele até a falência da medula óssea.
Telômeros
"Agora, com essas células iPS nós temos um sistema pelo qual podemos estudar em placa de cultura a disqueratose congênita. E isso pode servir de modelo para estudar outras doenças que atingem as células-tronco, como a anemia de Fanconi", disse Batista.
De acordo com o pesquisador, os pacientes com disqueratose congênita apresentam problemas em tecidos, como a pele e a medula óssea, onde as células-tronco estão em constante divisão para formar células especializadas. E, a cada vez que essas células se dividem, elas perdem um pedaço do cromossomo - neste caso, os telômeros.
Em função disso, os telômeros das células de pacientes com disqueratose congênita vão se encurtando progressivamente em cada divisão celular até chegar a um ponto de crise cromossômica em que a célula para de se dividir (entra em senescência), morre ou gera instabilidade genética, o que pode induzir ao câncer e ao envelhecimento celular.
"Os pacientes com disqueratose congênita têm, por exemplo, problemas nas unhas, pele e falência da medula óssea, o que indica defeitos na capacidade de suas células-tronco manterem a estabilidade desses tecidos", explicou Batista.
Mutação genética
Há cerca de doze anos descobriu-se que a doença está relacionada à mutação de diferentes genes de um complexo de enzimas responsáveis pela manutenção dos telômeros, a telomerase. Porém, esse complexo de enzimas só é ativo em células-tronco ou progenitoras, que também têm a capacidade de se diferenciar em um tipo especializado de célula .
Para poder estudá-los, os pesquisadores decidiram pegar células da pele (fibroblácitos) de diferentes pacientes com disqueratose congênita e reprogramá-las para se tornarem células-tronco pluripotentes induzidas (iPS), conforme a técnica desenvolvida em 2006 pelo cientista japonês Shinya Yamanaka.
"Com essas células, nós podemos estudar uma forma de aumentar a eficiência da telomerase mutada que os pacientes com disqueratose congênita possuem. E nós mostramos no estudo que com terapia gênica é possível contornar a mutação desses genes", disse Batista.
Segundo o pesquisador, expressando telomerase mutada, os telômeros das células-tronco dos pacientes com disqueratose congênita mantidas em cultura foram encurtando progressivamente com o passar do tempo. E, quanto mais rápido o telômero das células em cultura encurtava, maior também era a severidade da doença nos pacientes.
Além disso, o encurtamento precoce do telômero fez com que as células tivessem uma vida em cultura muito curta, o que é uma característica incomum para células-tronco, que são capazes de se renovar em cultura por enormes períodos.
"O que nós vimos foi que o encurtamento do telômero das células desses pacientes acabou com a capacidade de autorrenovação dessas células, e acreditamos que é isso que acontece com as células-tronco adultas desses pacientes. Elas não conseguem mais se dividir, porque os telômeros ficam muito curtos. E isso acarreta nos problemas que eles apresentam nos tecidos, que precisam se dividir com mais frequência", afirmou Batista.
Células modelo
O estudo é o primeiro que utiliza células iPS indiferenciadas como modelo para estudos de doença que atingem as células-tronco.
Segundo Batista, os estudos realizados nos últimos dois anos com essas células foram voltados para pesquisar diferentes doenças não relacionadas às células-tronco. Além disso, nesses estudos as células iPS foram diferenciadas para analisar tecidos específicos, como células do sistema nervoso.
Já no estudo realizado pelo brasileiro e os pesquisadores norte-americanos, eles optaram por não diferenciar as células iPS de pacientes com disqueratose congênita, mesmo não tendo certeza se conseguiriam observar diferenças nelas.
"Nós ficamos muito felizes quando conseguimos ver que essas células iPS são o modelo perfeito para estudar a disqueratose congênita", afirmou.
A pesquisa contou com a colaboração do professor da Universidade do Colorado e prêmio Nobel de Química de 1999, Thomas Cech, que também assina o artigo.
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