Um dos procedimentos usados será a polêmica técnica criada pelo médico goiano Áureo Ludovico de Paula, que foi aplicada no apresentador Faustão e deixou cerca de dez pacientes com sequelas graves. Especialistas divergem sobre segurança do método
O Hospital das Clínicas da USP vai testar dois tipos de cirurgias de redução de estômago em pacientes com diabete tipo 2 que tenham índice de massa corporal (IMC) entre 27 e 35 - considerado sobrepeso e não obesidade mórbida. Uma das cirurgias é a polêmica gastrectomia vertical com interposição de íleo - criada pelo médico goiano Áureo Ludovico de Paula e usada no apresentador Fausto Silva.
De Paula, proibido pela Justiça de operar usando o método, realizou cirurgias com essa técnica sem informar aos pacientes que ela era experimental, sem ter aberto protocolo de pesquisa e cobrando caro pelo procedimento - cerca de R$ 28 mil. Ao menos dez pacientes tiveram complicações graves, segundo o Ministério Público Federal.
No HC, há um protocolo de pesquisa aprovado pelo comitê de ética do hospital e a técnica será feita gratuitamente. Além da gastrectomia, os médicos também vão testar o by-pass gástrico (mais informações nesta página), amplamente reconhecido e indicado para a maioria dos pacientes obesos.
Com isso, a equipe do HC quer demonstrar que diabéticos não obesos, com IMC entre 27 e 35, podem se beneficiar e até se curar da doença. Hoje em dia, o consenso da Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD) recomenda a cirurgia de redução de estômago apenas no tratamento de doentes com IMC maior que 35.
A primeira cirurgia será feita na próxima semana. O paciente é um homem de 55 anos, com IMC 32 e diabético tipo 2 há 13 anos. Teve dois infartos e será submetido à técnica do by-pass gástrico. Ao todo, serão realizadas 40 cirurgias - 20 com cada método. A expectativa é que elas sejam feitas em até dois anos.
Segundo Marco Aurélio Santo, responsável pela pesquisa, pelo menos um terço dos diabéticos tipo 2 tem IMC entre 30 e 35. "Queremos diminuir a medicação e as complicações provocadas pela doença nesse grupo."
Márcio Mancini, responsável pelo grupo de obesidade do HC, diz que a redução de estômago tem se mostrado eficaz na remissão e até na cura da doença. Ele diz que a remissão total ocorre em cerca de 85% dos casos. "Por que aquele diabético que não é gordo e não responde bem ao tratamento com medicamentos não pode se beneficiar?", diz.
O endocrinologista Alfredo Halpern, um dos responsáveis pelo protocolo do HC, diz que qualquer diabético pode se candidatar à cirurgia, mesmo que não tenha comorbidades associadas (como obesidade ou hipertensão). A única exigência é que o paciente tenha o pâncreas capaz de produzir insulina. "Quando a função está prejudicada, o problema não será resolvido com uma cirurgia."
Para Halpern, a polêmica envolvendo a gastrectomia com interposição de íleo existe porque De Paula não submeteu os pacientes a um protocolo de pesquisa. "Ninguém discute a eficácia da cirurgia. O mundo está caminhando para soluções cirúrgicas pessoas diabéticas com IMC menores ", diz.
Consenso mantido. Luís Alberto Turatti, vice-presidente eleito da Sociedade Brasileira de Diabete, afirma que as recomendações cirúrgicas para diabéticos continuam as mesmas - apenas para pessoas com IMC maior que 35. Diz ainda que há muitas drogas que tratam a doença e a cirurgia deve ser exceção.
"Sou bastante reticente e temeroso em indicar a técnica para pessoas com IMC acima de 27. Daqui a pouco teremos de operar todo mundo", diz.
Carlos Vital, vice-presidente do Conselho Federal de Medicina, afirma que a entidade vê a pesquisa com naturalidade, já que foi aprovada pelo comitê de ética. "Mas, para ser reconhecida pelo CFM, são necessárias mais evidências", afirma.
Ricardo Cohen, presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica, também aprova a iniciativa. "Acho fundamental comparar a interposição ileal com uma técnica já consagrada para descobrir se ela serve para alguma coisa. É uma técnica mais complexa e, por enquanto, os resultados têm sido parecidos", afirma.
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